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Gestando Versos

“Gestando Versos” – o livro

Sobre “Gestando Versos”

A proposta deste livro é narrar a origem do processo criativo e o faz de uma forma inusitada: por dentro do processo criativo. O livro narra na primeira pessoa os dias em que os textos foram escritos.

Para isso, aliamos três diferentes estilos: Crônica, Conto e Poesia. A idéia é uma conversa direta, leve e divertida com o leitor, entremeada com saltos para dentro de uma história… foram inseridos na conversa, portanto, contos dos dia em que os textos foram escritos.

O tom de conversa da narrativa mantém aguçada a curiosidade do leitor, enquanto acompanha-me na descoberta do lirismo que gerou cada verso.

Confira, abaixo, a introdução do livro e o primeiro capítulo sobre Contos.

Gestando Versos
Introdução

Muita gente me pergunta como é que começam os textos. Onde eu vou buscá-los. Engraçado, eu sempre tenho a impressão que eles é que me buscam.

Escrever sobre como se escreve. Não me parece algo fácil. É uma tarefa parecida com escrever sobre como se respira. Com missão extra de fazer isso interessante para quem lê.

Imagino que isso possa acontecer de formas diferentes para diferentes escritores. Comigo existem algumas dinâmicas. E nenhuma planejada. Em geral, as palavras ficam rodeando até uma grudar no pensamento. Martelam na mente, como um jingle interminável. Às vezes, por dias. E, quando eu menos espero, esparrama texto inteiro no papel.  

Sempre me surpreendo com pessoas que escrevem todo dia. E alguns textos por dia. Se eu escrevesse nessa quantidade, não conseguiria fazer mais nada. Quando um texto começa a rodear, fico altamente dispersa. É um problema me concentrar. O pensamento fica olhando as palavras. Uma coisa.

Semana passada, escrevi um e-mail a um amigo, respondendo a uma pergunta sobre atitudes masculinas que as mulheres consideram irritantes ou encantadoras. 

Foi mandar o e-mail e a crônica começar a me rodear. Como eu não dei bola para ela (estava ocupada!), ficou ali me paquerando. Eu trabalhando em casa e a crônica sentada na cama me olhando. Expliquei que não tinha tempo para ela, mas não adiantou. Ficou ali esperando eu terminar o que estava fazendo. E me olhava de um jeito que dizia que quando quisesse esparramar em papel, não ia nem querer saber se eu estava ocupada ou não. Foram três dias com a crônica me rodeando. Escrevi ontem, graças a Deus! Estava me perturbando demais!

Sim, meus textos me mostram muito. Tem um poema chamado “Incursão Dentro de Mim” que fala disso. Só que, na verdade, mostram o olhar. Nem tudo o que eu escrevo eu vivi. Embora, certamente, expresse a forma como sou e sinto as coisas.

O engraçado é que as pessoas sempre acham que estou falando de situações já vivenciadas. Quando publico um texto mais apaixonado, tem sempre uma amiga que me liga dizendo que quer saber de tudo! Só que, geralmente, o texto é apenas uma soma do que já vivi ou quis viver. O embrião pode ter sido uma lembrança, um pensamento, um sonho ou até uma brincadeira com as palavras. “Meu Verso me Conta” fala exatamente disso.

Incursão dentro de mim

Saber de mim é fácil.
Nasci com olho que escancara e sorriso que denuncia.
Se não fosse suficiente, ainda tem a minha palavra…
que sai me esparramando em papel público com toda sem-cerimônia.
Quem lê meu verso faz incursão dentro de mim.

Meu verso me conta

 Sim
Meu verso me conta
Cada palavra que eu já escrevi me diz
Cada linha escorrida me fala

Verdade
Quem me lê me vê 

Sabe do que pensei, quis, achei
Ou senti

Descobre do que sonhei, criei, lembrei
Ou fiz

Mas, olha
Cuidado
Minha palavra me brinca
Faz esconde-esconde de mim

Se você quer mesmo saber
De tudo isso
O que eu já fiz
O que eu já quis
O que eu já vivi

Tira os olhos do papel
Olha pra mim

Me respira
Me toca
E me aprende 

Quem sabe assim eu te conto
Quem sabe assim

Eu me mostro

Primeiro Capítulo
Contos – Contando da Vida… da sua ou da personagem

Resolvi começar pelos contos. Vamos lá, então.

Contos contam da vida de alguém. Da personagem ou da sua.

Há autores que inventam personagens e situações, como Oswald de Andrade, há os que falam de suas próprias experiências, como Manuel da Nóbrega, e há os que mesclam ficção com realidade, como Dan Brown.

Acho que já visitei os três estilos. Isso porque o texto, às vezes, pede uma narrativa mais fiel. Outras vezes, inspira outros cenários… que se juntam à versão original.

O pensamento já começou a voar de novo?

Ah, dá um desconto. São três horas da manhã e o raio do livro não me deixou dormir. Ficou sentado aqui na cama olhando para mim.

Está bem, começo, então com “Ninguém é uma Ilha”. Esse texto foi o primeiro que eu escrevi sem destinatário e é um auto-retrato da infância.

Explico.

Eu escrevo desde os 10 anos. Mas só comecei a mostrar os textos quando fiz 40. Por vários motivos. Não vou te cansar explicando. O fato é que um dia uma amiga viu um texto meu e ficou me perturbando para eu mostrar para as pessoas porque achou realmente muito bom.

Não me pergunta qual foi o texto. Não lembro mais. Era algum dos que ficam na “Caixa”.

O que é a “Caixa”?

Caramba, você faz mesmo as perguntas, hein? risos

Quando eu era menina, existia uma caixa mesmo. Era onde eu guardava os meus textos. Hoje é um arquivo onde eu guardo textos que não quero publicar. Pode haver vários motivos: Ou não possuem universalidade suficiente, ou têm referência direta a alguma pessoa, ou são pessoais demais. O fato é que esses textos eu não mostro para ninguém. Mas gosto de ler de vez em quando.

Não, eu não vou te mostrar os textos da “Caixa”. Pelo menos não por enquanto.

Voltando ao “Ninguém é uma Ilha”. Foi o primeiro texto que eu escrevi sem destinatário. Não escrevi para mim e nem para um amigo. Escrevi para todo mundo. E é o primeiro texto de um grupo de contos que eu chamei de “Meia Vida em Quatro Atos”. Todos os textos deste grupo foram escritos no mês de junho. Um pouco antes do meu aniversário de 40 anos em setembro.

Estava atrasada para a academia. Perdeu a noção do tempo conversando com a Paloma.
Idéia doida. Mostrar os textos. Que coisa mais amostrada…“Olha só o que eu escrevi!”           

De mais a mais, quem é que ia querer ler os textos.
As pessoas não têm muita paciência para essas coisas.

Droga! Esqueceu celular. Voltar para pegar. Vai que ligam do trabalho.

Dito e feito. Abre a porta de casa e telefone tocando. Andréa.

            “Oi, Dedéééia! Bom dia! Meu aniversário? Setembro. Como é que você não sabe disso, criatura… você tá no aniversário todo ano já tem uns 20… risos… virginiana, lembra? Sou   terra, querida… risos.. não, você não esqueceu o meu esse ano… deve ter sido o de outra amiga… cata na agenda… risos… olha, tenho que ir! Academia. Projeto Verão Sem Canga!”

Elevador…   “virginiana… terra”.

Chega na academia…  “Marcelo é ar… libra”

Passa no bebedouro para encher a garrafinha.   “Adri é água… Peixes”

“Odeio esteira. Me sinto um ramster.”

Sempre me dizem que fazer exercício é ruim só no início. E que você, depois, começa a adorar.    Bem, quanto tempo será que leva o depois? Já malho há quatro anos e continuo odiando.    Coisa suada e chata. Se fosse suada e interessante, estava valendo. Chata e confortável, a gente atura. Mas suada e chata é de morrer.

    “Leão é fogo”

20 minutos de esteira. Bicicleta agora. Muito mais divertido.

“O que será que é Gêmeos? Ar ou água? Não é fogo. Com certeza, não é terra! Mamãe  jamais seria terra!”

“45 minutos! Chega! Meu Deus! Oito e meia! Reunião às dez!”

Hall do prédio….     “virginiana é terra”

Elevador….     “terra em meio a ar, fogo e água”.

Chuveiro rápido. Nove horas. Pronto. Arrumada! Iogurte na varanda….    “dia lindo”

“Bora, menina! Distraída hoje, hein?”

Elevador….  “virginiana… setembro… primeira semana de setembro”.

Hall do prédio…  “terra… plantada naquela família”

Abre a porta do prédio e sorri… “Que dia lindo. Um dia assim é um carinho de Deus.”

Pára. O ar enche os pulmões. Fecha os olhos. Levanta o rosto.
O sorriso vai sumindo devagarinho e olhar se perde no céu azul.

Vagarosamente, vai até o banco que fica em frente ao canteiro de flores cor de rosa.
Adora esse canteiro. Senta-se. Abre a pasta. Pega o caderno. Desliga o celular.

O olhar se suaviza e se perde através do canteiro. As vozes das crianças brincando ficam mais longe. A caneta começa a deslizar rápida pelo papel…

Ninguém é uma Ilha

Não se sabe se Deus foi carinhoso ou sacana quando plantou aquela menina da primeira semana de setembro naquela família. Um pedacinho de terra em meio a ar, fogo e água.A menina cresceu agarrada à própria terra, para não se perder… encantada demais com o que via a sua volta.
Era impossível não encantar-se com a intensidade do pai, protetor eterno da família, sedutor e vibrante em seu próprio brilho, espalhando força e calor pelos cantos da casa. Bravo às vezes, carinhoso sempre… para ela raramente um rugido.
Assim como foi inevitável deixar-se levar pelas palavras quase ininterruptas da mãe, também mulher, como ela, mas com dupla face e humor, alma gêmea bivitelina de si mesma. Conselheira constante, com opiniões as mais inusitadas, soprou na própria filha mais que vida. Soprou sonho, soprou compaixão. E mostrou, desde cedo, à teimosa filha da terra, a beleza de se permitir mudar de idéia.
Os irmãos, um do ar e outro da água, rodearam a pequena ilha, soprando carinho, ondulando em volta dela proteção.
Passou a infância correndo e brincando com eles.
Juntos caíram, juntos se levantaram, juntos riram e choraram, brigaram e fizeram as pazes em dois minutos, centenas de vezes, como cabe a irmãos. Se protegeram de outros, zangados, preferindo levar a porrada eles mesmos… porque só irmãos podem se bater. E se empurraram, uns aos outros, rindo, em direção a outros, sabendo o quanto seria bom. E deitaram-se de mãos dadas no escuro… e contaram os sonhos assim que acordaram… e falaram uns aos outros de seus medos, seus pudores, seus anseios… falaram dos dias ruins quando aconteceram, falaram das vitórias nos dias em que as viveram, contaram seus desejos pouco antes de decidir se iriam mesmo se entregar a estes… e, logo depois, quer em jubilo, quer em arrependimento… deliciaram-se em saber-se entendidos pelo olhar, sem precisar explicar-se… e também explicaram-se uns aos outros, sem necessidade, só pelo gosto de ser ouvido por quem te aceita, mesmo que não te entenda.
E, de alguma forma, a menina deu terra aos dois… como de alguma forma, seu irmão deu a ela ar e sua irmã a irrigou de forma abundante.
Havia também um terceiro, que mesmo não tendo vindo da mesma fresta, compartilhava com eles a irmandade. Este levantou seu último vôo, levado de volta ao ar cedo demais, mas não sem antes soprar-se para dentro da menina que, hoje mulher, só precisa levantar o rosto no vento para lembrar-se dele.
E assim correu a infância, sem qualquer responsabilidade. Nem mesmo as notas na escola, que isso sempre veio também fácil.
Anos mágicos, vagarosos, luminosos… uma década necessária para dar chão ao que veio em seguida… mas isso já é outra história.

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Poesia Falada: Confira tudo sobre o CD no link Verso em Voz

Maiores informações: contato@poetaflaviacortes.com.br

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Textos devidamente registrados na Biblioteca Nacional e protegidos quanto aos seus direitos autorais.

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